quinta-feira, 17 de abril de 2008

O cigarro, a cama, e o infinito.

"É preciso abraçar a volúpia, fartar-se de prazeres, e não ter medo da Morte"
Goethe

Alguns assuntos eu não gosto de conversar com qualquer pessoa, eu sei que nem todos estão preparados e acostumados a ouvir ideias que perturbam ao ponto de ficar na cabeça como aquelas músicas chata que ouvimos na rádio uma vez apenas e não esquecemos por um tempão.

Dias atrás eu estava em casa lendo Oscar Wilde, tomando um bom vinho que o Rodrigo (meu irmão) tinha comprado, sequei a garrafa. Já era tarde, talvez quatro e meia da manhã e subitamente fiquei com um tesão absurdo de fumar um cigarro, procurei pela carteira e só encontrei um, um cigarro para a madrugada inteira! Não tinha como sair e comprar mais, estava tudo fechada àquela hora, não havia o que fazer, era aquele e pronto.

Fumar um último cigarro é algo intrigante, prazeroso e doloroso, acredite. Eu sabia que era o último e que eu deveria fumar com calma para aproveitar cada tragada, benditos segundos eternos. Ao mesmo tempo eu fumava com muita intensidade, o que obviamente faria ele terminar mais rápido, algo que eu não queria. Uma coisa era certa: depois de alguns minutos eu não teria mais perto de mim aquela companhia.

Quando eu terminei, comecei a pensar - como se fosse um filme passando pela minha cabeça - sobre várias situações na vida que se eu soubesse que eram as últimas eu teria feito melhor, com mais paixão e mais compreensão, menos covardia e menos impulsividade. Na maiorias das situações não controlamos o destino, tampouco sabemos que aquele era o último beijo e depois seria apenas um permanente Adeus, não fazemos ideia se hoje será a última vez que veremos nossos amigos, tudo pode acontecer, será possível ter consciência disso? Quais as consequências práticas dessa atitude?

Não acho saudável viver um constante Carpe Diem, como se o mundo fosse acabar em alguns segundos e precisássemos fazer tudo na hora, como uma criança chorona que não pode esperar e esperneia para ter suas vontades realizadas não se importando com mais nada, muito arbitrário é o que isso parece ser. A vida não é um incessante 'agora', mas sim sucessões de questionamentos 'porque eu deveria'. O surreal em tudo isso é que enquanto eu fumava aquele último cigarro eu tinha a sensação de que controlava, que manipulava o destino.

Estavamos na minha cama - ela vestida de preto e eu com tons mais claros, ambos com sapatos caros -, sentada no meu colo de frente pra mim fitando-me com aqueles olhos de Mulher fatal, fez carinho em meu rosto e perguntou se eu estava angustiado, se havia algo que eu queria compartilhar. Então contei essa impressão que tive sobre o último cigarro e argumentei sobre as consequências na vida das pessoas que tem consciência da finitude da felicidade e todo prazer. É preciso ter responsabilidade com quem amamos e protegemos, eternizar os belos momentos, fazer o perfeito apresentar-se a nós e não ter medo da Morte.

"E nós somos intensos, não somos, pequeno?"
"Sem dúvida, meu anjo"

Filme: Liegen Lernen ~ Alemanhã, 2003 - Helmut & Britta

4 comentários:

Anônimo disse...

Eu não vou tentar ser filosófica aqui, não tenho tua eloqüência mas vou tentar esboçar uma pseudo-reflexão aqui.
Acho que o conhecimento do fim leva a atitudes incoerentes. Nada é sincero, você aproveita qualquer circunstância escrota para fazer algo que é desnecessário mas pode levar a uma realização momentânea pois sabe que não há tempo para consequências ruins.
Acho que não se deve buscar intensidade nos fatos. A intensidade é algo que emana de nós, tudo tem o valor natural que deve ter. Forçar algo a significar mais doq é, é burrice.
Ando em uma fase que acho que eternizar as coisas só faz mal.
Tudo que eu eternizei em algum momento da minha vida, vem me assombrar.
A minha realidada, o meu hoje... eu não quero que ele seja eterno, estou torcendo pelo amanhã.
Vendo coisas que eu passei, que eu queria que durassem pra sempre; que eu queria que fosse meu ontem, meu hoje e meu amanhã. Elas não estão mais aqui.
Pensar nisso, me destrói.
Sonhar demais, querer demais, desejar o eterno; não é algo para oessoas como eu ...
Não sabemos lidar com a realidade, sempre tive problemas com isso. Mas a tão temida realidade é algo que eu preciso enfrentar.
Por isso em muito eu deixei de sonhar. Se eu o faço, eu devaneio em excesso; e no fim, quem fica mal sou eu. Sou a única que se perde no 'eterno sonho', vivendo sempre um filme do passado, morrendo de dor e prazer todas as mesmas vezes. Sem respirar o hoje.
O conhecimento do fim é uma das coisas mais tristes que eu consigo imaginar.

Ani Cristina Bariquello disse...

Releitura:

Era uma noite fria, depois de uma desgastante discussão, estavam deitados na cama dela, vestiam quase nada. Havia pouco espaço, mas o suficiente para que ficassem como eles gostam... tão juntos, um sobre o outro, a ponto de em alguns momentos não saberem exatamente onde começa ele e onde termina ela.
Ela perguntou a ela:

- E o que acontecerá agora?

Ela recordou aquele dia em que conversaram sobre “as conseqüências na vida das pessoas que tem consciência da finitude da felicidade e do prazer”.

E retribuiu a pergunta:

- Você acha que é o começo ou o fim de alguma coisa?

E percebeu que pior ainda do que saber que a certeza do fim, é a dúvida.

Ela desejou que assim como ela, ele compreendesse que não importa se é o último cigarro ou não, é sempre bom apreciar seu sabor. Isso não significa uma sucessão de loucuras.

- Somos intensos, não somos, pequeno?

DIEGO AUGUSTO MÉLO disse...

Somos.

Anônimo disse...

Seu texto me lembrou muito uma cena.Eu estava sentada em cima da minha mala, na rodoviaria de Balneario Camboriu.
Sozinha eu fiquei duas horas a espera do meu onibus, minha amiga, companheira de viajem ja tinha partido rumo a Floripa.
Eu nao tinha mais dinheiro, so em sobrava um cigarro..resolvi fumar.
Seria o ultimo ate chegar em Porto.
Nesse momento pensei que gostaria de ter nao precisar ir embora, queria ter ido pra Floripa, queria mais dois dias, uma semana.
Nao tinha como,all good things come to an end, e antes que me desse conta o cigarro tambem acabou.
Bom lembrei disso, comentario longo demais!bleh