domingo, 16 de março de 2008

Em defesa da menina

Na aula de sociologia, um professor perguntou "quando começou a sua história?" para uma garota tímida que estava sentada perto de mim. Ela responde que tinha história antes de ter nascido. O professor fez piada da sua resposta e não permitiu que ela terminasse de falar, enquanto todos da classe em ignorância paralítica coletiva riram, menos eu. Possivelmente, o professor crê em um conceito de história e a aluna, aparentemente, devia ter em mente algo mais amplo e complexo, que ficou mal entendido perante o grande grupo. Aqui, tento defender a aluna e descrever o que ela poderia estar querendo dizer com sua resposta. Será que existe algo como a Tabula Rasa de Locke ?
Será que nascemos sem nenhum tipo de moral ou capital social? Ora, a análise de que um branco nasce como opressor e o negro como vítima, o rico como burguês e o pobre como escravo-proletário, faz sentido para muitas correntes de pensamento. Quando começa a minha história? Tenho dúvidas de que foi no ano de 1986. Minha vida não é nada de extraordinário, eu não sou especial. Eu sou a continuidade da vida como categoria metafísica. A minha "vida" começou com a primeira forma de "vida" deste planeta. Seja adão e Eva ou os primeiros organismos, se os evolucionista assim preferirem. Sou um ente conservador e tento inconscientemente reproduzir não apenas a espécie que pertenço, também a vida em si. Será que a minha vida tem fim? Duvido. A morte, como nos ensinaram - em teoria - não existe. Eis uma das grandes ilusões ocidentais que demanda conceitos como alma, "além", juizo final, céu/inferno, etc. A mocinha da nossa sala disse algo muito bonito porque fez a vida parecer fantástica e interminável, sem começo nem fim, caótica. E o professor, coitado, a ciência tomou conta daquele coração-pedra que está ligado ao seu corpo.

imagem: Paul Gauguin - De onde viemos? o que somos? para onde vamos? (óleo sobre tela, 1898)

Um comentário:

Anônimo disse...

Escritos sobre teorias que desconheço, mas comentando sobre o ocorrido em si.... eu diria que seu professor é um cretino e teus demais colegas de classe são tão cretinos quanto.

Mas quem nunca riu sem PENSAR sobre o que estava rindo, sem pensar que uma risada pode ter uma conseqüência gigante.

"É trauma, é trauma... eu sei."
Já passei por situações como esta da menina que sentava uma carteira a sua frente. No fim a gente acaba se "acostumando" e se fechando, fechando... até quando?
"É trauma, é trauma... eu sei."

E que bom que pelo menos UM não riu dela, melhor ainda que este UM foi você.

;]

Sem dúvida o conhecimento que seu professor acredita ter sobre tudo que ele já estudou, aquele maldito diploma que muitas vezes não serve pra NADA, deve ter subido pra cabeça...

"as coisas que você possui acabam te possuindo"

É o poder, o maldito poder e as várias formas de lidar com ele. Pena, lastimável pena que a maioria se perde antes de aprender a ter poder. (sobre qualquer coisa e em qualquer situação).

"...acabam te possuindo."



*gostando cada vez mais dos teus textos, estão de alguma forma se aproximando dos meus pensamentos ou eu dos teus, não sei.*

;****